O Rio Grande do Norte registrou uma redução nas denúncias de assédio sexual e estupro de vulnerável contra crianças de 0 a 11 anos no primeiro quadrimestre de 2025. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Sesed), os casos de assédio caíram de 2 para 0, enquanto os de estupro diminuíram de 143 para 114. Especialistas alertam que essa redução pode refletir uma subnotificação associada ao medo de denunciar e não a queda real da violência. O cenário acende um alerta para reforçar as políticas de enfrentamento e convida à reflexão no Maio Laranja, mês dedicado à conscientização e combate ao abuso e à exploração sexual infantil.

Embora positivo à primeira vista, a advogada Sâmoa Martins, presidente da Comissão da Infância e Juventude da OAB/RN, fala em cautela na análise dos números porque a redução de denúncias pode significar o agravamento do silêncio, imposto pelo medo, pela vergonha e pela ausência de um adulto confiável. “A criança não denuncia sozinha. Ela precisa confiar. Precisa saber que será ouvida, acolhida, protegida”, pontua.

A subnotificação é um dos principais entraves na luta contra o abuso infantil. O psicólogo Gilliard Laurentino, do Centro de Defesa de Crianças e Adolescentes do Rio Grande do Norte (Cedeca Casa Renascer), observa que, a nível nacional, somente cerca de 8% a 10% dos casos chega ao poder público. Na sua avaliação, fica evidente a necessidade de investir nas políticas de prevenção em espaços como escolas e hospitais.

Em contrapartida à redução de registros de violências contra o público infantil, houve um aumento de 6,3% nos casos envolvendo adolescentes de 12 a 17 anos, com 134 ocorrências registradas até abril de 2025. Para Sâmoa Martins, esse dado revela a crescente exposição dos jovens a formas de violência no ambiente digital. “A violência hoje não precisa mais de toque físico. Ela chega pelo celular, por uma conversa, por uma imagem”, alerta.

Educadora parental Kennya Gralha reforça que os pais devem observar sinais como mudanças de humor e retração nos filhos | Foto: cedida

O psicólogo Gilliard Laurentino aponta que os crimes no meio virtual são mais difíceis de se detectar e de se aplicar as políticas públicas. “A violência sexual em redes sociais, online, o estupro virtual, mostra que esses dados são ainda mais alarmantes. O mundo da internet, no qual a gente ainda não tem legislações específicas para lidar, tem feito com que muitas violências migrem para os meios online”, analisa.
A falta de presença da família na vida digital dos filhos é um fator que os torna vulneráveis e isolados. A advogada Sâmoa Martins diz que o medo de punição impede os adolescentes de denunciarem abusos, revelando a falta de proteção afetiva no lar. “Falar de abuso não é espalhar medo, é ensinar que as crianças têm voz e serão protegidas”, aponta. “Precisamos de mais delegacias especializadas, de equipes capacitadas com escuta empática e qualificada”, conclui.

Gilliard Laurentino, psicólogo, pontua que é necessário haver mais vontade política para alocar recursos nos orçamentos municipais para o enfrentamento de abusos, aproveitando que neste ano, todos os municípios precisam entregar os seus PPAs, planejamentos financeiros para os próximos quatro anos. “É importante incluir nos orçamentos formas de enfrentamento. A gente só consegue fazer política pública com dinheiro”, frisa.

A educadora parental Kennya Gralha reforça que os pais devem observar sinais como mudanças de humor e retração nos filhos, manter conversas regulares e criar uma relação de confiança. “A escuta ativa e a criação de uma relação de confiança são essenciais para que a criança se sinta segura em compartilhar qualquer desconforto”, afirma. Seu livro, “Meu Corpo Ninguém Toca. Eu grito! Eu corro! Eu conto!”, visa ensinar de forma lúdica que o corpo da criança é dela, com um QR Code que leva a conteúdos educativos e um guia para pais e educadores fortalecerem a proteção no dia a dia.

“O livro nasceu do desejo de quebrar o silêncio em torno da proteção infantil e ensinar. Queremos abrir esse diálogo, criar um espaço seguro para que as crianças se expressem e para que os adultos saibam como acolher, escutar e proteger”, declara.



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