O bumba meu boi é uma das maiores referências culturais do Maranhão. É pela força ancestral, pureza, bailado sinônimo fé e devoção, que fez a brincadeira tornar-se Patrimônio da Humanidade. Ganhar o mundo em seus diversos sotaques e encantar como uma obra-prima de domínio público. Os franceses que o digam através do Coletivo Novilho de Paris, idealizado pelo músico maranhense Isaías Alves.
Enfim, na tarde calorosa do último dia 20 de julho, à beira do Rio Sena, o grupo Novilho de Paris realizou uma apresentação inédita e histórica, reafirmando o poder ancestral da cultura popular maranhense em solo francês. A segunda apresentação oficial do projeto trouxe à capital da França a força vibrante do Bumba Meu Boi, em uma intensa mistura de cores, sons e tradições que emocionou o público parisiense.
O Novilho de Paris é fruto de mais de vinte anos de pesquisa e vivência do músico, pesquisador e mestre maranhense Isaías Alves. Fundado com o propósito de dar continuidade à brincadeira, ampliar o alcance do bumba meu boi e conectar seus diversos sotaques aos públicos europeus, o grupo reúne músicos brasileiros e locais, que conseguem transmitir a essência e a alegria desse festejo popular.
“Foi simplesmente maravilhoso a segunda apresentação oficial do grupo”, relembra Isaías, emocionado. “Em pouco tempo, consegui transmitir os fundamentos da tradição, especialmente as células rítmicas dos pandeiros nos sotaques Matraca, Zabumba e Pindaré. A participação do público, que dançou, vibrou e se entregou à festa, foi emocionante.”
Dois caminhos, uma missão
Isaías Alves é reconhecido como mestre na transposição dos ritmos maranhenses para a bateria moderna, influenciando uma geração de bateristas no Maranhão e no Brasil. Sua trajetória em Paris segue dois focos complementares.
De um lado, há seu trabalho no jazz instrumental e experimental, com o projeto Emaranhado, que já ganhou destaque em palcos renomados, como o Le Baiser Salé Jazz Club. Nele, Isaías constrói pontes entre influências afro-indígenas brasileiras e as linguagens do jazz, da improvisação e da música contemporânea.
Do outro lado, está o Novilho de Paris, uma extensão viva da tradição maranhense e da pesquisa ancestral do artista. O grupo apresenta os sotaques do Bumba Meu Boi: Matraca, Zabumba, Pindaré e Orquestra, preservando a essência coletiva, ritualística e festiva dessa manifestação cultural.
Uma aula viva e uma homenagem aos mestres
Mais que um espetáculo, a apresentação foi uma verdadeira aula interativa. Isaías conduziu a plateia por uma experiência sensorial, ensinando ritmos com o corpo e as mãos, como se todos tivessem matracas. Explicou o significado das indumentárias, o papel dos pandeiros e a relação simbólica do fogo na festa.
Em momentos de emoção, prestou reverência a grandes nomes que marcaram sua trajetória e a história do Bumba Meu Boi, como Zé Olhinho (Boi de Santa Fé), Zequinha de Coxinho (Fruto da Raça Show), Regina Avelar (Boi de Leonardo), que o recebeu na sede do boi para compartilhar saberes e ofereceu todo o suporte para representar o Boi de Zabumba nessa apresentação, Coxinho e Tião Carvalho (Boi de Pindaré e Cupuaçu), além dos lendários Humberto de Maracanã e Chagas da Maioba.
“A conexão com esses mestres e mestras mantém viva a espiritualidade e a força coletiva do Boi. Eles são a base da resistência cultural que o Novilho de Paris representa”, afirma Isaías.
Uma cultura que se reinventa e ultrapassa fronteiras
Natural de São Luís, Isaías Alves carrega o Maranhão no corpo e na música. Sua pesquisa alia saberes tradicionais, afro-diaspóricos e indígenas a uma estética contemporânea que dialoga com o mundo. Já apresentou seu trabalho em países como Portugal, Egito, Itália, Marrocos, Inglaterra, Venezuela, Sri Lanka e Argentina.
“Não quero fazer folclore preso ao passado e pra gringo ver. O que faço é dar continuidade ao que mestras e mestres de nossa cultura sempre nos proporcionaram. É o tambor do Maranhão falando outras línguas, mas sem perder sua alma”, explica.
Novilho de Paris hoje
O grupo, que conta com músicos como Rosivaldo Cordeiro, Timbó Afro Dance, Tedy Santana, Thierry Galand e Ayraldo Petit, reafirma a missão de manter viva a cultura maranhense e ampliá-la para além das fronteiras, com o coração pulsando no ritmo do tambor.
Radicado em Paris há quase uma década, o multi-instrumentista amazonense Rosivaldo Cordeiro vê no Novilho de Paris uma oportunidade única de reconexão entre o Maranhão e a Amazônia, através de uma herança cultural comum que cruzou o Brasil. “Sou de Manaus, e o Estado do Amazonas é um dos herdeiros dessa rica e maravilhosa cultura do Maranhão, que foi levada ao coração da Amazônia por trabalhadores migrantes. Lá, ganhou uma pequena inversão de nomes e passou a se chamar ‘Boi-Bumbá’”, explica.
Para Rosivaldo, participar do Novilho de Paris foi uma experiência marcante. “Contribuir para a criação de uma brincadeira de Bumba Meu Boi do Maranhão em Paris, com toda a sua força ancestral, foi algo muito especial. O projeto tem uma energia de ajuntamento poderosa, e Isaías conduz tudo com uma disciplina quase religiosa, além de um respeito e uma simpatia que envolvem todo o público. É realmente inspirador.”
Com uma trajetória dedicada à valorização das expressões musicais da floresta e das culturas populares brasileiras, Rosivaldo integrou a histórica banda Carrapicho, que levou a música amazônica ao cenário internacional com o sucesso Tic-Tic-Tac.
No dia 20 de julho de 2025, no Festival Brasil-França, o Novilho de Paris marcou presença como um dos destaques da programação, mostrando que o Bumba Meu Boi é uma cultura viva, capaz de encantar públicos internacionais e celebrar uma herança ancestral com sofisticação e potência.
“A fundação do grupo aconteceu durante o evento da Embratur, em abril deste ano, com a presença de Marcelo Freixo, presidente da Embratur, e de Socorro Araújo, secretária de Turismo do Maranhão (SETUR). Desde então, temos trabalhado coletivamente para preparar essa nova fase do bumba meu boi em Paris. É a continuidade de uma vivência que pulsa intensamente. Um Boi que dança firmemente com os dois pés na tradição, mas que também mantém os olhos voltados para o futuro, levando nossa cultura para o mundo”, conclui Isaías Alves.
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