Documento construído pela Adeppe ao lado de todas entidades policiais prevê núcleos de mediação comunitária, protagonismo na formulação de políticas de segurança, recomposição do efetivo e avanços históricos para mulheres policiais
Pernambuco está prestes a escrever um capítulo singular na história da segurança pública do país. O Estado é o único em que todas as entidades representativas da Polícia Civil — que tem a Associação dos Delegados de Polícia de Pernambuco (ADEPPE) como uma das percursoras — se uniram para construir, em consenso, uma proposta de Lei Orgânica que moderniza a instituição e redefine seu papel diante da evolução da criminalidade. A instituição tem mais de 208 anos de vida e ainda não tem sua certidão de nascimento.
Delegados, policiais civis, peritos criminais, peritos papiloscopistas e escrivães trabalharam juntos na elaboração do texto, que se encontra em fase final e deve ser entregue ainda no mês setembro à governadora Raquel Lyra. A categoria aguarda a audiência para apresentar oficialmente o projeto e abrir o diálogo sobre sua aprovação.
A Lei Orgânica é um marco porque não se limita a consolidar direitos e deveres da categoria: ela propõe um novo modelo de Polícia Civil para o futuro, alinhado às transformações sociais e às exigências do combate à criminalidade organizada. A primeira frente de inovação está na criação de núcleos de mediação e conciliação espalhados pelo Estado, desenvolvidos em parceria com universidades, que atuarão em crimes de menor potencial ofensivo. A medida busca aproximar polícia e comunidade, reduzir conflitos e estimular soluções pacíficas que desafoguem o sistema judicial. Esse vácuo na solução de pequenos conflitos nas comunidades tem feito com que as facções criminosas se apoderem desse meio e aumentam sua atuação nas populações carentes. Esse espaço deve ser retomado pelo Estado-Investigação trazendo solução pacífica do conflitos.
Outro ponto de destaque é a garantia de protagonismo da Polícia Civil na formulação dos planos de segurança pública no tocante a investigação criminal e repressão as facções criminosas. A proposta assegura que a instituição seja ouvida e tenha papel ativo nas decisões estratégicas do Estado, reconhecendo a expertise acumulada dos investigadores, delegados e peritos na construção de políticas de segurança mais eficazes.
O texto também prevê a autonomia financeira da corporação, permitindo que a Polícia Civil estabeleça com clareza de quanto precisa para estruturar delegacias, modernizar equipamentos e investir em recursos humanos. Esse desenho é fundamental para dar previsibilidade à gestão e evitar que a instituição fique à mercê de repasses fragmentados. Com isso, possa prestar uma melhor serviço à sociedade.
No campo estrutural, a lei propõe uma inovação de impacto: o dimensionamento técnico do efetivo policial, definido a partir de estudos conduzidos pelo delegado geral. O cálculo levará em consideração fatores como extensão territorial, densidade populacional e índices de criminalidade, garantindo racionalidade e transparência. Hoje, Pernambuco tem pouco mais de cinco mil policiais civis em atividade, diante da necessidade estimada de 12.000. Ademais, a lei traz autorização automática para realização de concurso público quando o efetivo tiver menos de 20% do determinado por lei.
“Estamos diante de uma iniciativa histórica. Pela primeira vez, todas as entidades policiais se uniram para escrever uma Lei Orgânica, e isso traduz legitimidade. Precisamos que o governo do Estado abra esse diálogo para transformar o texto em lei”, afirma Diogo Victor, presidente da Associação de Delegados e Delegadas de Polícia de Pernambuco (ADEPPE).
No campo da modernização tecnológica, a proposta prevê investimentos consistentes em softwares de inteligência e programas digitais de repressão, com ferramentas capazes de acompanhar a sofisticação das organizações criminosas. Esse eixo coloca a Polícia Civil de Pernambuco em sintonia com práticas internacionais de segurança baseadas em inteligência de dados, análise de vínculo e inovação tecnológica.
A proposta também é pioneira na valorização da mulher dentro da corporação. O texto assegura proteção à servidora gestante, com realocação para atividades compatíveis; concede licença-maternidade de 180 dias, prorrogável por mais 60; e garante a redução da carga horária para mães lactantes até os dois anos de idade da criança. Há ainda prioridade para férias coincidentes com o calendário escolar dos filhos menores de 12 anos e, sobretudo, a criação de um canal independente e sigiloso para denúncias de assédio moral, sexual e discriminação de gênero, com apuração célere e apoio psicológico e jurídico às vítimas.
“Modernizar a Polícia Civil é também torná-la mais justa e inclusiva. A defesa da mulher policial é um passo civilizatório que mostra que a instituição está preparada para respeitar e valorizar quem a compõe”, reforça Cláudia Molinna, vice-presidente da Adeppe.
Mais do que uma reivindicação de categoria, a Lei Orgânica é apresentada como um projeto de interesse da sociedade pernambucana, que poderá contar com uma polícia mais estruturada, eficiente e próxima da população. As entidades aguardam agora que a governadora receba o documento para que Pernambuco se torne referência nacional em inovação institucional, valorização de profissionais e modernização do combate à criminalidade.
“A Polícia Civil precisa de mais efetivo, estrutura e respeito. A Polícia Civil deve ser tratada como uma Polícia de Estado, Investigativa, sem interferência extenas. Essa Lei não é apenas para nós, policiais, mas para todo pernambucano que deseja uma instituição forte e preparada para enfrentar os desafios da segurança”, conclui Diogo Victor.