A paisagem que cerca Picos, no coração do semiárido piauiense, não é mais a mesma. O verde que teimava em resistir ao sol forte agora se rendeu a um mar de terra rachada e capim ressecado. O que era um rio, hoje é apenas um leito de memórias. O que era pasto, virou pó. E neste cenário de espera, a única pergunta que ecoa é: a chuva chegará a tempo?
A princípio, a estiagem de 2025 não esperou o calendário. Ela veio antes, intensa e implacável, antecipando um período de dificuldades que muitos produtores já temiam, mas para o qual poucos estavam verdadeiramente preparados.
A Escolha Difícil: Segurar ou Deixar Partir?
De acordo com o agricultor Israel, em entrevista para a TV Brasil, a matemática é cruel e simples. Sem pasto para o gado comer e sem água no rio para matar a sede dos animais, o prejuízo se avoluma a cada dia que passa. A solução imediata, embora dolorosa, é uma só: reduzir o rebanho.
“Eu mesmo não tenho um plano de correr não, agora mesmo tenho que vender uns dois [animais] para ficar com menos, e comprando uma raçãozinha para ir realizando”, relata ele, sua voz carregada da resignação de quem lida com as intempéries há uma vida.
Vender para comprar. É um ciclo de sobrevivência. A venda de alguns animais gera um capital mínimo para comprar ração e tentar manter vivos os que ficaram. É uma corrida contra o tempo, onde a ração é o fôlego comprado até que as chuvas decidam voltar.
Criatividade para a terra que Não Deu Fruto
O problema, porém, vai além do pasto seco. A seca não poupou as lavouras, quebrando a espinha dorsal da autonomia do pequeno produtor.
Ao mesmo tempo, a criatividade toma conta desses criadores. O uso de bananeiras, palmas e cactos são alternativas que surgem para alimentar o gado.
Sem a colheita de milho, eles perdem a capacidade de produzir sua própria ração, ficando reféns do mercado e dos preços, um golpe duplo em um momento já extremamente frágil. E essa criatividade é essencial para contornar esses momentos.


O papel da Conab
Neste contexto desolador, a presença do poder público se torna uma tábua de salvação. A Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) atua como o grande “estoque estratégico” do sertão. Em 2025, a Unidade Armazenadora de Picos recebeu um reforço vital: 1.500 toneladas de milho em grãos.
Atualmente, o local mantém aproximadamente 970 toneladas do produto, um volume que, segundo estimativas, deve ser suficiente para suprir a demanda da região pelos próximos quatro a cinco meses.
E há um plano de continuidade: uma nova demanda de abastecimento já está prevista para ser encaminhada até o final de agosto, com previsão de entrega entre setembro e outubro. É um fio de esperança organizado, um planejamento que tenta vencer a imprevisibilidade do clima.
Mais do que uma crise, uma lição
A situação em Picos é um retrato urgente de um desafio antigo. Ela escancara a vulnerabilidade da pecuária familiar frente às mudanças climáticas e a importância crítica de políticas públicas de estoque regulador e apoio emergencial.
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