Em entrevista recente, a escritora americana Zadie Smith, autora de Dentes Brancos, revelou que suas pesquisas para o próximo romance que escreverá estão centradas na pensadora francesa Simone Weil (1909-43). “Ela está no ar no momento”, disse Smith ao jornal The Washington Post. “Sua personalidade é extrema. Ela é um mon­te de coisas ao mesmo tempo.”

Simone Weil não lançou nenhum livro em vida. Publicou artigos, al­guns deles assinados com o anagra­ma Émile Novis (um nome masculino), e acumulou pilhas e pilhas de cadernos de anotações, que foram editadas em li­vro aos poucos. O peso e a graça foi o primeiro, publicado quatro anos depois da sua morte. Em junho, uma nova tradução deste livro foi lançada no Brasil, pela Penguin-Companhia das Letras.

“Vida e pensamento raramente têm uma correspondência tão íntima como na história de Simone Weil”, observa a escritora Leda Cartum, tradutora e prefaciadora da nova edição de O peso e a graça, na piauí deste mês. “O que ela pensava, manifestava; e seu pensamento só tinha sentido se fosse manifestado em todos os níveis da existência.” Em uma resenha, a crítica americana Susan Sontag descreveu Weil como uma pessoa “insuporta­velmente idêntica às próprias ideias”. Essas ideias influenciaram pelo menos cinco Prêmios Nobel de Literatura – André Gide, T. S. Eliot, Albert Camus, Czesław Miłosz e Sea­mus Heaney – e dois papas – João XXIII e Paulo VI –, além de inúmeros pensa­dores, filósofos, ativistas políticos e po­etas de ontem e de hoje.

Nascida em 1909, em uma família de judeus não praticantes, de posição social confortável, Simone Weil decidiu, aos 25 anos, se tornar operária e foi trabalhar na linha de montagem da Renault. “Lá recebi para sempre a marca da escravidão, como a marcação a ferro quente que os romanos faziam na testa de seus escravos mais desprezados. Desde então, é isso que me consi­dero: uma escrava”, escreveu ela, em seu diá­rio. Trabalhou na fábrica por quase um ano, até que uma inflamação da pleura impediu que continuasse com a empreitada.

Pouco depois, com a eclosão da Guerra Civil Espanhola, Weil decidiu se juntar aos republicanos. Não durou muito no campo de batalha. Trabalhando na cozinha, um dia, por acidente, enfiou o pé num buraco cheio de óleo quente que os camaradas tinham acabado de usar para cozinhar. Foi levada para um hospital em Barcelona, e a gravidade da queimadura poderia ter sido fatal, se seus pais não tivessem corrido para resgatá-la. “Se você tiver uma filha, reze a Deus para que ela não seja uma santa”, disse sua mãe.

“Não é possível assumir a tarefa de uma santa”, afirma a escritora e professora Sylvie Weil, sobrinha de Simone, no livro Chez les Weil (“Na casa dos Weil”, ain­da não traduzido para o português). Na obra ela narra a experiência de viver sob a influência de dois gênios: a tia pensadora e o pai matemático, André Weil (1906-98).

Sylvie vive em Nova York, cidade onde nasceu há 82 anos, depois que seus pais e avós imigraram para os Estados Unidos, fugindo dos nazistas. Em 1945, André foi convidado a dar aulas na USP e se mudou com a família para São Paulo, onde todos moraram durante dois anos. “Eu fico triste de não saber mais falar português”, diz Sylvie Weil em entrevista a Leda Cartum. São brasileiros os primeiros li­vros infantis de que ela se lembra de ter ganhado – e que ainda guarda consigo. “André sempre foi extremamente grato à cidade de São Paulo, que ofereceu casa e trabalho quando ele não tinha nada. Meus pais adoraram o Brasil, a vida deles no Bra­sil, e fizeram amigos para a vida toda.”

Sua família, porém, ficou desenraizada. “A morte de Simone deixou uma ferida incurá­vel. E a partida do Brasil foi o rompimen­to do qual nunca me recuperei”, conta Sylvie.

Assinantes da revista podem ler a íntegra do texto neste link.





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