A lógica da disputa política é, hoje, a de uma divisão irreconciliável. De um lado, coalizões de uma “direita sem medo” de se aliar à extrema direita. De outro, alianças de setores originários da esquerda com setores da direita tradicional que não querem se aliar à extrema direita. Diante dessa divisão, a atitude dos progressistas em relação às recentes iniciativas de Donald Trump revela que eles não têm uma imagem de futuro a oferecer. Na análise do cientista social Marcos Nobre, no ensaio O Brasil sob Trump – que a piauí publica na edição deste mês –, o mundo está perigoso demais para os progressistas seguirem com uma atitude paralisante como essa. “Para sair do imobilismo, o primeiro passo é reconhecer que as iniciativas de Trump resultaram em transformações irreversíveis.”
Na avaliação de Nobre, a última década no mundo foi marcada por um multilateralismo disfuncional e uma governança global degradada. Parte da elite progressista com posições de poder em instituições internacionais já tinha se dado conta dessa situação e buscou saídas para o impasse, sem sucesso. O que Trump está fazendo agora não é consertar a disfuncionalidade e a degradação da situação global. “Ele simplesmente retirou o véu dessa ordem caduca”, escreve o cientista social. “Ao fazê-lo, escancarou o que estava efetivamente acontecendo: por debaixo da ordem disfuncional em declínio, estava em funcionamento uma ordem regida de maneira crua e direta pelo poderio militar, territorial, econômico, cultural e tecnológico como únicos critérios da divisão do poder global e de seu exercício.”
Trump oficializou esse estado de coisas – e a irreversibilidade da reorganização em curso traz a necessidade de uma reestruturação do campo do possível. Na desglobalização em curso, a amplitude dos fluxos comerciais e das cadeias de suprimento dos anos 1990 e 2000 tende certamente a diminuir. Mas é razoável pensar que a redução dessa amplitude pode favorecer acordos no interior de blocos de países, produzindo uma subglobalização. É nesse quadro que Nobre sugere pensar a posição do Brasil.
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