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    Piauí

    Costuras políticas – revista piauí

    20 de maio de 202520 Minutos de Leitura
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    Como acontece toda primeira segunda-feira de maio desde 1948, o Met Gala, sediado no museu Metropolitan, de Nova York, reuniu no início do mês a nata da moda. A lista de convidados do evento que arrecada fundos para o The Costume Institute, espaço do Met dedicado à moda, é concorridíssima e, desde 1995, está sob a tutela de Anna Wintour. Ao ser perguntada sobre quem ela nunca convidaria para o evento, a diretora da revista Vogue respondeu com o desdém elegante que lhe é peculiar: “Donald Trump.” 

    A rejeição ao presidente americano e ao que ele defende está em sintonia com a exposição que o Met sedia até outubro, intitulada Superfine: tailoring black style (Superfino: alfaiataria em estilo negro). Com trezentos itens, a mostra é uma aula sobre como homens negros, de diferentes épocas e geografias, subverteram o racismo por meio da elegância – do século XVIII ao dandismo do Harlem ao afrofuturismo de hoje. Com essa exposição, o museu-catedral da elite branca nova-iorquina se posiciona como território de resistência cultural, homenageando o orgulho ancestral da cultura negra.

    A alfaiataria clássica que compõe o dandismo negro também foi vista nos cerca de quinhentos desfiles das coleções de outono-inverno 2025 do hemisfério Norte. Os anos de dominação do conforto da moda streetwear e de busca do pertencimento através da logomania (logos estampados em roupas e acessórios em tamanho gigante), pelo menos por agora, ficaram para trás. Com a humanidade vivendo dias de incerteza, a economia e a política planetária em fase caótica, as roupas andam enrijecidas e passam a funcionar como um escudo protetor e um grito de resistência: eu ainda estou aqui e inteiro. Não à toa, tenho a percepção de que a peça de roupa mais vista na temporada internacional é o paletó cinza. Sim, aquele bem sem graça. Ele foi apresentado de todas as formas, para mulheres e homens, misturado de maneira moderninha ou careta usado com calça social. É ele que encabeça a tendência do “corpcore” – moda inspirada nos trajes corporativos.

    Como acontece todo janeiro, o calendário da moda abre com as propostas para o guarda-roupa masculino. Neste ano, os estilistas entregaram, além de alfaiataria e paletós estruturados, gravatas, sapatos de couro pesados e até gel no cabelo. O look Wall Street, com todos querendo ter cara de ricos, aparece fetichizado. Nos faz lembrar da cena do filme O Aprendiz (2024), em que o então jovem Donald Trump é levado ao alfaiate por seu mentor, o polêmico advogado Roy Cohn. A partir daí, Trump abandona os ternos bege e marrom de sua fase no Brooklyn – a ideia é que ele se apresente como um self-made milionário, mesmo antes de sê-lo. 

    Daquele período, o presidente americano guarda a predileção pelos ternos azul-marinho de lã merino da marca italiana Brioni – que já viu cortes mais modernos. Hoje, Trump usa roupas desajustadas, com tudo grandalhão, e gravata vermelha muito longa e larga. O boné panfletário compõe o visual, e cumpre a função de estar no foco de qualquer foto. O visual Maga (Make America Great Again) serve para transformá-lo em bandeira nacionalista ambulante.

    Quando, em fevereiro, os desfiles chegaram ao prêt-à-porter (varejo) feminino, a expectativa era, assim como aconteceu semanas antes na alta-costura, de vermos arquétipos tradicionais de gênero, com cinturas bem marcadas, look de uma época de mulheres frágeis e submissas. Mas não. O que sobressaiu foi o resgate do chamado power dressing, com ombros exagerados que simbolizam ambição e autoridade. Calvin Klein, Saint Laurent, Anthony Vaccarello e Stella McCartney aderiram à estética. Difícil, aliás, foi achar uma passarela, tanto masculina quanto feminina, sem o paletó cinza. 

    O maior choque da temporada, porém, é a volta do uso de peles. O que era vergonhoso num passado recente agora está em grande parte dos desfiles. O retorno pode ser um efeito das políticas defendidas por Trump – negar a emergência ambiental e afastar-se das pautas progressistas que ganharam força na última década. Em seu primeiro dia de mandato, com Los Angeles ainda sofrendo com os incêndios, ele assinou a saída dos Estados Unidos do mais importante tratado internacional de combate às alterações climáticas, o Acordo de Paris, firmado em 2015. 

    Para algumas marcas, trazer peles de volta às passarelas é uma tentativa de se aproximar dos jovens que não querem ser obrigados a nada e rejeitam o que veem negativamente como “politicamente correto”. Há peles falsas sintéticas e há quem, como Prada, Gucci e Saint Laurent, aposta em pelos obtidos por meio da tosa, que imitam peles e com aparência ultrarrealista que confunde o consumidor. Já Dolce & Gabbana e Fendi usam peles verdadeiras sem qualquer receio. Parece que ninguém assistiu ao documentário Slay (2022), que expõe os impactos ambientais e sociais da indústria de peles, plumas e pelos de bicho. Ao satisfazer a ansiedade do consumidor por status, as marcas simplesmente deixaram de fingir que se importam com o futuro do planeta.

    Mas existe uma outra ala, a dos estilistas que, diante de um futuro ainda nebuloso, apostam em estratégias disruptivas e menos conservadoras. Entre os destaques está Marc Jacobs, que foi da Louis Vuitton por dezesseis anos e neste ano abriu o calendário não oficial da Semana de Moda de Nova York com coleção de sua marca própria. Ao repensar o corpo humano, Jacobs acerta no neosurrealismo – ano passado, o Manifesto Surrealista fez cem anos. Suas peças exibem proporções exageradas e cores fortes, como saídas de um sonho hiperbólico.

    Outro que olha para o futuro e para a sustentabilidade de sua produção é o holandês Duran Lantink, o grande destaque dessa turma de vanguarda, que desfilou em Paris. Ele explora formas inusitadas, é irônico e moderno, pois tem o reaproveitamento de materiais no coração de seu trabalho. Lantink, que acaba de ser anunciado como novo estilista da marca Jean-Paul Gaultier, é adepto do upcycling (o nome da moda para reciclagem e reutilização de peças), proposta originada na reformulação de peças já existentes e que na maioria das vezes seriam descartadas. Lantink sinaliza que a segunda década deste século pode ser, como foi há cem anos, de grande loucura criativa. Ele não está sozinho. “A onda retrógrada é dominante e vai permanecer por enquanto. Ao mesmo tempo, a contracultura deve emergir desafiando o conservadorismo”, afirma à piauí Rony Rodrigues, fundador da agência Box 1824, que rastreia como os movimentos culturais são criados e disseminados. 

    Ao se rebelar ou reafirmar o status quo, a moda é sempre ferramenta de poder. Em 20 de janeiro, durante a posse de Trump para seu segundo mandato, sentados logo atrás de Hillary e Bill Clinton, estava o patriarca Bernard Arnault – homem mais rico da França e atualmente o quinto do mundo – e seus filhos Alexandre, vice-CEO da Moët Hennessy, e Delphine, CEO da Dior. Se no primeiro mandato estilistas rejeitaram abertamente vestir os Trump, desta vez o poderoso chefão do luxo estava lá participando de uma das maiores reuniões de bilionários já vista no Capitólio. 

    A família dona do conglomerado LVMH saiu de Paris rumo a Washington esperando garantir que suas 75 marcas não sofram com as tarifas protecionistas implementadas pelo governo americano. E também para prestigiar um vizinho. Em Nova York, a Trump Tower e a LVMH Tower, dois dos edifícios comerciais mais valiosos do mundo, estão a dois minutos a pé um do outro, na altura da Quinta Avenida e a Madison com a Rua 57. 

    A posse serviu para escancarar a guinada conservadora dos novos donos do mundo, Zuck, Elon e sua turma, detentores dos dados de quase todos os habitantes do planeta. Eles são os tecnofeudalistas, termo que descreve o domínio absoluto que esses empresários têm sobre a economia e a vida digital de todos nós, gerando um novo tipo de aristocracia tecnológica. Na década passada, a turma do Vale do Silício modificou os códigos de vestimenta dos negócios com seus moletons, camisetas e jeans. 

    Agora, se afastam do normcore, a simplicidade máxima . Querem mostrar poder. Usam gargantilhas de ouro grossas, relógios de milhões e roupas estampadas com mensagens. Em 2024, Mark Zuckerberg foi ao evento de sua empresa, a Meta, com uma camiseta larga onde se lia Aut Zuck aut nihil (Ou Zuck ou nada). A frase em latim é adaptada de Aut Caesar aut nihil, atribuída ao chefe militar romano César Bórgia, que expressa a busca pelo poder absoluto. Sem vergonha de se intitular imperador, Zuckerberg pediu, no início deste ano, durante entrevista em um podcast, por mais energia masculina nas empresas.

    A vestimenta também foi ponto de atenção quando Elon Musk, em fevereiro deste ano, apareceu para uma reunião na Casa Branca com jeans, cinto com fivela cowboy com logo da Tesla, boné preto com o logo da Maga e camiseta com as palavras Tech Support. “Acontece que ele não é o rapaz do suporte técnico. Ele é o homem mais rico do mundo e o maior doador da campanha que elegeu Trump”, noticiou a rede de tevê MSNBC. Com o look, “Elon enviou uma mensagem ao mundo de que ele não precisa se conformar ao código de vestimenta da Casa Branca – até mesmo o presidente estava de terno e gravata!”, complementou a emissora. Como escreve Yuval Harari em seu livro mais recente, Nexus, Uma breve história das redes de informação, da Idade da Pedra à inteligência artificial, manda mais quem é dono dos dados. Na Roma Antiga, conta Harari, “Lúcio Aélio Sejano, comandante da Guarda Pretoriana, controlava toda a informação dirigida ao (imperador) Tibério e assim tornou-se o verdadeiro governante”. E Tibério, um fantoche. Será assim nos Estados Unidos?

    O momento atual tem também uma força careta que não se via desde os anos 1950. A #TradWife, hashtag de esposa tradicional, virou referência para mulheres que defendem a feminilidade extrema com gêneros e valores rígidos. Dona de casa perfeita, sustentada pelo marido, ela usa vestidos de cintura marcada. Duas grandes musas desse grupo nas redes sociais são a loiríssima Hannah Neeleman, ex-miss Nova York e Utah, conhecida como Ballerina Farm, e a modelo Nara Aziza Smith, que cozinha usando vestidos deslumbrantes e conquistou mais de 11 milhões de seguidores no TikTok. Ela é a mais querida entre os fashionistas.

    As Trad Wives chegaram à Casa Branca. Ivanka Trump desfilou na posse de seu pai criações de duas marcas dos Arnault. O look do Baile da Liberdade, um Givenchy, é réplica do vestido branco bordado em flor preta que Hubert de Givenchy criou em 1954 para Audrey Hepburn usar no filme Sabrina. Na história, estilo conto de fadas, Sabrina, filha do mordomo de uma família abastada, passa uma temporada em Paris. Ao retornar, refinada e bem-vestida, é disputada pelos filhos do patrão. 

    O posicionamento da Trad-Ivanka foi reforçado em outro traje, o da cerimônia da posse, quando portou um tailleur de modelo e cor que lembram o figurino das esposas oprimidas da série The Handmaid’s Tale, baseada no romance distópico O Conto da Aia, de Margaret Atwood. O mais inacreditável é pensar que a roupa, que sob a ótica do momento transmite uma mensagem totalmente antifeminista, foi criada pelos ateliês da Dior, que desde 2016 estão sob a direção criativa da mais feminista das estilistas, Maria Grazia Chiuri. 

    Há dez anos, a italiana Maria Grazia marcou seu território ao estampar slogans como “We Should All Be Feminists” e “Future is Female” nas camisetas da Dior. O que, então, explica a roupa de Ivanka? Maria Grazia criou o tailleur a contragosto? Talvez soubesse (do boato que ainda não se confirmou) que seria demitida da Dior e por isso aceitou fazer qualquer coisa? Uma pista pode ser o desfile de alta-costura da Dior, uma semana após a posse de Trump, que trouxe modelos em saias de crinolina vazadas, como se fossem gaiolas, sugerindo um certo desconforto e um senso de repressão que ronda a moda contemporânea.

    A posse de Trump se apropriou de uma outra tendência-estereótipo. A esposa de mafioso, tradução literal de #MobWife, incorporada na Casa Branca pela primeira-dama Melania Trump, que encarnou a versão “MobWife em dia de funeral”. O presidente, aliás, gosta dessa estética. Musa maior das Mobs, sua primeira mulher, Ivana, morreu em 2022, mas deixou um legado maximalista de vestir, com profusão de volumes, peles e penteados estilo bolo. 

    Melania portava tailleur azul escuro com camisa branca fechada até o pescoço e chapéu que escondia seus olhos. Visual surpreendentemente severo e sério para um dia que deveria ser de empatia com o país e alegria compartilhada com o marido. Bem diferente da posse do primeiro mandato, quando, com um Ralph Lauren azul claro, tentou emular a sofisticação de Jackie Kennedy. É praxe a primeira-dama usar estilista do país. A responsabilidade do look, então, ficou para Adam Lippes, ex-diretor criativo da Oscar de la Renta. Trabalhando com Melania desde 2017, ele criou a imagem da Mob Wife gélida, intransponível e ameaçadora, que parece ter saído de um filme de espionagem da época da guerra fria. Alguns analistas viram no look da primeira-dama uma tentativa de reforçar a autoridade do governo do marido. Outros interpretaram como uma crítica velada à atmosfera opressiva da administração.

    Historicamente, quanto mais autoritário um governo, mais ele se preocupa com a moda. Um exemplo é o Segundo Império Francês (1852-70), tema de Karl Marx no livro O 18 de Brumário de Luís Bonaparte (1852). “Justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e as coisas, em criar algo que jamais existiu, os homens conjuram em seu auxílio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens”, escreve Marx. Napoleão III imitou o look do tio, Napoleão Bonaparte: uniforme militar, com botões dourados e postura rígida. A ideia era forjar a continuidade entre os dois Napoleões e se legitimar como líder. Amante do luxo e da ostentação, Napoleão III tinha em sua mulher Eugénie a maior influencer. Ela o ajudou a projetar a imagem de uma França próspera. Foi sob Napoleão III que surgiu a alta-costura, inspirando toda a Europa – as elites de outros países seguiam o que era moda em Paris.

    Neste período, em 1858, o pai da alta-costura, o inglês Charles Frederick Worth, abriu seu atelier em Paris tendo Eugénie como maior cliente. A última imperatriz dos franceses era fã de vestidos de cintura fina e saias sustentadas por crinolinas – armações de metal e tecido. A silhueta enfatiza a feminilidade e reforça o papel tradicional das mulheres (qualquer semelhança com as Trad Wives e com os espartilhos apertados desfilados na alta-costura de grifes como Schiaparelli e Jean-Paul Gaultier, por exemplo, não é mera coincidência). 

    No século XX, a moda continuou a desempenhar papel crucial na política. Adolf Hitler, na Alemanha, era quase sempre visto de uniforme militar que exprimia sua obsessão por disciplina, ordem e hierarquia, valores centrais do nazismo. No Brasil, Getúlio Vargas (presidente de 1930-45 e de 1951-54) usava chapéus panamá de feltro que reforçaram a imagem de líder com autoridade e, ao mesmo tempo, próximo do povo. 

    Por vezes identificado como simpático ao fascismo, Vargas seguiu uma de suas premissas, os uniformes com inspiração militar em todas as escolas públicas brasileiras, para criar identidade nacional, como argumenta a pesquisadora Letícia Borges. O fascismo explorou a força da vestimenta como símbolo de controle social. De todos os ditadores, quem mais levou a cabo o uso da moda como propaganda política foi Benito Mussolini, que governou a Itália de 1922 a 1943. É dele a frase: “Qualquer poder está destinado a fracassar diante da moda. Se a moda diz que as saias são curtas, você não conseguirá alongá-las, mesmo com a guilhotina.”

    A milícia fascista chamada “Camisas Negras”, formada por 30 mil homens, ajudou Mussolini a tomar o parlamento na Marcha sobre Roma. Eles inspiraram os Camisas Verdes, no Brasil, e os Camisas Marrom, na Alemanha nazista. A roupa masculina do período do fascismo expressava força, ordem e fidelidade ao Estado. O próprio Mussolini exibia o físico e sua virilidade em trajes atléticos. As mulheres italianas se vestiam de maneira modesta e prática, com saias discretas e vestidos sem excessos. Mussolini ajudou a estabelecer o Made in Italy que faz sucesso até hoje, sinônimo de qualidade e luxo. Aos interessados na relação entre o fas-cismo e o fas-hion, vale a pena a leitura de Fashion under Fascism, Beyond the Black Shirt que acaba de ganhar edição atualizada em inglês (sem tradução em português, por enquanto), de Eugenia Paulicelli. 

    O primeiro desfile da italiana Miuccia para a marca de sua família, a Prada, foi em 1988, e nele podemos encontrar várias referências à época de Mussolini. Não que ela, comunista de carteirinha na juventude, seja defensora do fascismo. Mas é fato que ficaram marcados em sua memória as saias-midi soltas, os tailleurs chamados de ugly-chic (valorização do inusitado, por vezes considerado feio) e as roupas femininas que fogem do sexy bodycon (peças ajustadas que realçam a silhueta do corpo) – DNA da grife. Miuccia, formada em ciências políticas, é uma das mais influentes estilistas de todos os tempos. Em seu desfile de outono 2025, assinado com o codiretor criativo Raf Simons, eles questionam: “O que é feminilidade hoje e como ela pode ser definida?“ Na passarela, a resposta veio em vestidos pretos e práticos com costuras inacabadas, saias com cinturas tortas e proporções alteradas, colocados sobre o corpo de maneira displicente e apressada. Um glamour cru, para encarar o mundo como ele é, sem escapismo. 

    A feminilidade no vestuário varia de acordo com os tempos. Nos anos 1920, quando as mulheres conquistaram o direito ao voto e chegaram ao mercado de trabalho, o espartilho saiu de moda e os vestidos passaram a ser retos. Depois da Segunda Guerra, nos anos 1950, com o mundo devastado, o look da mulher reprodutora voltou. Considerada revolucionária para a época e uma das mais reverenciadas de toda a historia da moda, a silhueta ampulheta do New Look, criada por Christian Dior em 1946 para ressaltar as formas femininas de forma elegante, é uma expressão de otimismo e mostrava ao mundo que as famílias tradicionais voltariam a viver em paz. 

    E o fio segue… Nos anos 1960, a moda e a política continuaram a se retroalimentar. No auge da Guerra Fria, John Kennedy prometeu “enviar um homem à Lua e trazê-lo de volta à Terra em segurança”. Estilistas como André Courrèges, Paco Rabanne e Pierre Cardin refletiam os anseios e foram os grandes expoentes da moda espacial, influenciados pela tecnologia e pelo design industrial. As minissaias dominaram, assim como as cores vibrantes. No dia do assassinato de Kennedy, Jackie vestia o agora célebre tailleur rosa Chanel para acompanhar o marido em Dallas. A escolha não foi por acaso. Quando Chanel voltou a desfilar em 1954, depois de ter fechado a marca durante a Segunda Guerra, foi recebida com desânimo pelas francesas. Já as americanas, em especial as texanas, adoraram a praticidade dos looks. Jackie queria agradar.

    Os anos 1960 foram ricos. No contraponto dos Mods, sempre paramentados com seus ternos de cortes finos e blusas de gola alta, uma outra parcela da juventude, ao ver pela primeira vez a terra do espaço, se apaixonou pelo planeta e por sua natureza. Os “hippies”, alinhados a maneiras alternativas de viver, queriam ficar perto do solo, da água, dos animais. Era uma forma de existência frugal que aparecia em roupas leves e de tecidos naturais. Com a pílula e a revolução sexual, a busca era por paz e amor. Pela primeira vez na história, a cintura feminina ficou desnuda.

    O otimismo dos 1960 passou, e os 1970 chegaram com o movimento punk e new wave, com a estilista britânica Vivienne Westwood sendo a principal referência. Impulsionados pelo choque do petróleo de 1973, pela recessão e a inflação que tomou conta do Reino Unido, os jovens, desempregados, insatisfeitos e revoltados, criaram a estética agressiva que acompanha o gênero musical. O “Do It Yourself” (Faça você mesmo) refletia a falta de oportunidades e a necessidade de burlar o sistema. 

    A cada período de excesso e de controle, a moda reage com rupturas. Na década de 1980, Wall Street e figuras como Donald Trump brilhavam. O power dressing materializava o individualismo. Em paralelo, o avanço da Aids, a guerra Irã-Iraque e a queda do muro de Berlim jogaram todos em uma ressaca mundial. Nos anos 1990, a moda reagiu. O estilo grunge, surgido em Seattle, trouxe consigo as camisas de flanela, as calças rasgadas e a estética “heroína-chic”, que enfatizava a aparência andrógina, pálida e magra associada ao uso da droga. A maquiagem tinha boca marrom e os olhos borrados de preto como quem acordou deprimido e nem se olhou no espelho. 

    Nos anos 2000, a chegada do novo milênio trouxe a esperança de um futuro promissor. A beleza saudável de Gisele Bundchen dominou. Um tipo de ostentação ingênua e jovem, com calças de cintura baixa e tops justíssimos, definiu o reinado de it-girls como Paris Hilton e Britney Spears. No final da década, o boho chic (túnicas, franjas e saias longas) conviviam com o indie, marcado por jeans skinny, óculos Ray-Ban modelo Wayfarer e jaquetas de couro – look que fez o sucesso de Hedi Slimane, então na Dior masculina. 

    Com Obama presidente, de 2009 a 2017, a década valorizou a inclusão, a diversidade, o fim de preconceitos, a preocupação com o meio ambiente, os corpos livres, as modelos trans, os negros e minorias. Marcas como Supreme, Off-White e Givenchy, por Riccardo Tisci, transformaram o streetwear em artigo de luxo. Leggings, tênis e moletons passaram a ser usados no dia a dia. O fim das gravatas foi anunciado – lembro quando Ermenegildo Zegna veio ao Brasil e me contou, em um jantar na casa de Donata Meirelles e Nizan Guanaes, que a entrada de suas lojas iam deixar de exibir gravatas e o lugar delas seria ocupado por tênis. 

    Foi um período em que reinou o mantra entre fundos de investimento: “Nunca invista em um empreendedor de terno e gravata.” A informalidade era símbolo de inovação e de que as ideias que valem a pena saem das garagens e dormitórios, não de salas de reuniões engomadinhas. No mesmo ano da assinatura do Acordo de Paris, o papa Francisco escreveu o Laudato Si, um texto que, acima da religião, serve de diretriz para um planeta mais harmonioso. A agenda ESG ganhava força. E, em 2018, Virgil Abloh (1980- 2021) assumiu como diretor artístico do masculino da Louis Vuitton, tornando-se o primeiro negro à frente de uma empresa da LVMH. No grupo concorrente, o Kering, a Balenciaga fez moletons com logotipo em referência à candidatura do socialista Bernie Sanders à presidência dos Estados Unidos. Perto do que estamos vivendo, isso parece fazer parte de um passado distante.

    No momento, habitamos um campo de batalha com armas sofisticadas. Uso a palavra “armas” intencionalmente para evocar a frase da estilista mineira radicada no Rio, Zuzu Angel, dita em setembro de 1971 ao jornal Chicago Tribune: “A moda é minha única arma.” A afirmação ocorreu após Zuzu realizar nos Estados Unidos o que é considerado um dos primeiros desfiles de protesto da moda. Ao driblar a censura e apresentar a coleção International Dateline Collection III – Holiday and Resort, na residência do cônsul do Brasil em Nova York, ela usou suas criações para lutar contra a ditadura militar e a prisão e desaparecimento de seu filho, Stuart Angel. Uma fita preta adornava o braço de cada modelo e os looks exibiam, além do seu habitual anjo da guarda, estampas de canhões, uniformes, quepes, aviões, jipes, pássaros engaiolados, o sol atrás de grades e palhaços armados. 

    Invoquemos o espírito de Zuzu. Em meio ao conservadorismo nostálgico que assola o mundo, talvez estejamos vivendo o momento em que a próxima revolução fashion é gestada – menos nos salões de alta-costura e mais nos ateliês independentes e nas mãos daqueles que ainda acreditam que vestir-se pode ser um ato de resistência.





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