Crédito, EPA/Shutterstock
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- Author, Mariana Schreiber e Leandro Prazeres
- Role, Da BBC News Brasil em Brasília
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Os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China.
Em tom duro, a carta diz que a decisão é uma resposta à perseguição que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estaria sofrendo no Brasil, devido ao processo criminal que enfrenta no Supremo Tribunal Federal (STF), acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado.
Além disso, Trump também justifica o aumento de tarifa argumentando que o Brasil adota barreiras comerciais (tarifárias e não tarifárias) elevadas contra os EUA, o que estaria desequilibrando o comércio entre os dois países.
Hoje mais cedo, Trump havia afirmado que adotaria novas tarifas contra diferentes países, citando o Brasil diretamente.
“O Brasil, por exemplo, não tem sido bom para nós, nada bom. Vamos divulgar um número do Brasil, acho que ainda esta tarde ou amanhã de manhã”, afirmou, durante evento com líderes da África Ocidental na Casa Branca.
O governo brasileiro refuta a argumentação do governo americano, destacando que a balança comercial entre as duas nações é historicamente favorável aos EUA.
O lado americano acumulou saldo positivo de US$ 43 bilhões nos últimos dez anos, segundo a Câmara Americana de Comércio para o Brasil.
Em 2024, o país de Trump “foi o destino de 12% das exportações brasileiras e origem de 15,5% das nossas importações (US$ 40,7 bilhões)”, destaca um relatório sobre o tema publicado pelo departamento econômico do Bradesco em fevereiro.
Os principais produtos exportados para os EUA são óleos brutos e combustíveis de petróleo, produtos de ferro e aço, aeronaves, café e celulose, diz o relatório do banco.
Já os mais importados pelo Brasil são motores e máquinas não elétricos, óleos combustíveis e brutos de petróleo, aeronaves e gás natural.
No dia anterior, Trump já havia ameaçado tarifar o bloco integrado pelo Brasil, em 10% “muito em breve”. A ameaça veio logo após a cúpula do grupo no Rio de Janeiro, liderada por Lula. A declaração final da cúpula fez críticas a ações da gestão Trump, sem citar diretamente os EUA e seu presidente.
Em abril, a gestão Trump anunciou um tarifaço, elevando a tributação sobre importações vindas de diversos países, mas depois adiou a entrada em vigor de muitas delas.
A taxa foi considerada positiva para o país, já que, dentre as alíquotas extras aplicadas, esse foi o patamar mais baixo. Ainda assim, o governo brasileiro tinha esperança de reverter esse aumento por meio de negociações.
Já muitos países que receberam taxas mais altas em abril tiveram a aplicação das novas alíquotas suspensa por 90 dias, prazo que expiraria em 9 de julho. No entanto, os EUA só chegaram a acordos no período com dois países: Reino Unido e Vietnã.
Por isso, a Casa Branca começou a enviar, na segunda-feira (7/7), cartas para países avisando da retomada da alta das tarifas, mas adiando o aumento para dia 1º de agosto.
Com isso, manteve o espaço aberto para novas negociações e mesmo novos adiamentos. Para analistas, os sucessivos adiamentos das tarifas mostram que há preocupação sobre os efeitos negativos que o encarecimento de importações pode ter sobre a economia americana.
Entre os países já notificados, estão Japão e Coreia do Sul, ameaçados com uma tarifa extra de 25%
Trump também apresentou na segunda-feira planos para uma tarifa de 40% sobre produtos de Mianmar e Laos, de 36% sobre o comércio de Tailândia e Camboja, de 35% sobre produtos da Sérvia e Bangladesh, de 32% sobre a Indonésia, de 30% sobre itens da África do Sul e de 25% sobre Malásia e Tunísia.
Na visão de Trump, aumentar as alíquotas de importação vai proteger e fortalecer a indústria dos EUA, enquanto críticos afirmam que vai encarecer a produção americana e desatar uma guerra comercial global.
Brasil convoca diplomata americano a dar explicações sobre críticas a processo contra Bolsonaro
A nova tarifa foi anunciada dois dias depois de Trump manifestar publicamente apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), criticando o processo criminal que ele enfrenta no Supremo Tribunal Federal (STF).
A situação escalou com novas declarações oficiais do governo americano, o que levou o Ministério das Relações Exteriores a convocar nesta quarta-feira o encarregado de negócios da Embaixada dos Estados Unidos, Gabriel Escobar, para prestar esclarecimentos.
A medida foi uma reação às manifestações do Departamento de Estado norte-americano e da Embaixada americana em Brasília a respeito do julgamento de Bolsonaro, réu em um processo por suspeita de tentativa de golpe de Estado.
A convocação de um representante diplomático é uma das medidas mais sérias no universo das relações internacionais.
Tradicionalmente, esse tipo de convocação é feita aos embaixadores e embaixadoras, mas, atualmente, o comando da embaixada norte-americano está sem embaixador apontado pelo governo norte-americano e por isso, o convocado foi Gabriel Escobar, que atua como chefe da representação diplomática no momento.
O ato equivale a um país mostrar o desagrado com medidas adotadas por outra nação com quem ele mantenha relações. A convocação, em alguns episódios, pode anteceder um eventual rompimento das relações diplomáticas entre dois países.
Na terça-feira (8/7), uma nota do Departamento de Estado divulgada pelo portal UOL afirmou que “a perseguição política a Jair Bolsonaro, seus familiares e apoiadores é uma vergonha muito aquém da dignidade das tradições democráticas do Brasil”.
Nesta quarta-feira, a Embaixada dos Estados Unidos divulgou uma nota com teor semelhante afirmando que o órgão reforça as declarações do presidente Donald Trump.
“O Brasil está fazendo uma coisa terrível no tratamento ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Eu tenho assistido, assim como o mundo, como eles não fazem outra coisa senão irem atrás dele, dia após dia, noite após noite, mês após mês, ano após ano! Ele Não é culpado de nada a não ser por ter lutado pelo povo”, disse Trump em seu perfil na rede social Truth Social.
Em outro trecho, Trump classificou a situação de Bolsonaro como uma “caça às bruxas”.
“O grande povo do Brasil não vai tolerar o que estão fazendo com seu ex-presidente. Estarei assistindo à caça às bruxas de Jair Bolsonaro, sua família e milhares de seus apoiadores muito de perto. O único julgamento que deveria estar acontecendo é um julgamento pelos eleitores do Brasil — chama-se eleição”, continuou.
No mesmo dia, Lula rebateu as declarações de Trump em duas oportunidades. Na primeira, por meio das redes sociais, ele disse que o Brasil não aceitaria interferências.
“A defesa da democracia no Brasil é um tema que compete aos brasileiros. Somos um país soberano. Não aceitamos interferência ou tutela de quem quer que seja. Possuímos instituições sólidas e independentes. Ninguém está acima da lei. Sobretudo, os que atentam contra a liberdade e o estado de direito”.
Em outro momento, no final da Cúpula do Brics, no Rio, Lula disse que Trump não deveria dar “palpite” sobre o Brasil.
“Eu não vou comentar essa coisa do Trump e do Bolsonaro. Tenho coisa mais importante para comentar do que isso. Este país tem lei. Este país tem regras e este país tem um dono chamado povo brasileiro. Portanto, dê palpite na sua vida e não na nossa”, disse o presidente.
Esta é a segunda vez que o encarregado de negócios dos Estados Unidos é convocado pela diplomacia brasileira a prestar esclarecimentos. A primeira aconteceu em janeiro deste ano, quando Escobar foi convocado a explicar o tratamento dado pelos Estados Unidos a imigrantes brasileiros que estavam sendo deportados.